Há
poucos dias acadouse
um acordo entre a Femp (organização espanhola que representa os
municípios, uma organização com muitas eivas, mas iso vai ficar
para outro comentário) e o Governo para que estes (entre outros
aspectos menores) emprestem dinheiro ao estado. Realmente parece
curioso, por vários motivos:
Em primeiro lugar, é curioso que os concelhos tenham tanto dinheiro
sem utilizar como para que possam emprestarlho a todo um governo de
um estado tão importante quanto o deste reino.
Em segundo lugar, é curioso que os concelhos sejam tão generosos
para prestar os cartos, especialmente neste momento em que a
administração local esta tam mecessitada de dinheiro para cobrir as
graves emergências geradas pela pandemia.
Terceiro, porque até onde eu sei, esta é a primeira vez que um
presidente da Femp teve que usar seu voto de qualidade para dirimir
uma votação. Os únicos votos a favor foram os do PSOE, enquanto
Podemos, o outro parceiro do governo, se limitou à abstenção. O
resto dos partidos votaram em contra (aliás, vemos que na FEMP vótase
por partidos, o que não deija de ser, também, curioso).
Quarto porque, realmente, os termos do empréstimo também não
parecem deslumbrantes. Um juro baixo, um período de retorno muito
longo (10 anos com 2 períodos de carência, o que dá 12 anos) e
poder gastar livremente (quase) uma pequena parte do total entre este
ano e o próximo (Aqui está obviamente a mãe do cordeiro , porque
os municípios não podiam gastar o seu dinheiro, tinham de o ter nos
bancos, gerando liquidez (aos bancos) e pagando (também aos bancos)
para os ter ali. Coisas da lei Montoro e da generosidade dos bancos e
que explica a primeira curiosidade e mesmo a segunda)
Mas é claro, como diz o artigo que compartilho (Carlos Gribau,
concelheiro de Ciempozuelos, em Sin Permiso) “Por trás do
complicado debate sobre números, déficits, regras de gastos e
empréstimos, estão realmente escondidos problemas democráticos
muito profundos, associados ao papel de uma instituição política
chave para qualquer democracia, como são os concelhos”.
Como mesmo reconheceu uma figura não sospeitosa de democrata
convicto como Manuel Fraga, na sua proposta de Administração
Única (1), o concelho, como administração mais próxima dos
cidadãos, é quem teria de resolver todos e quaisquer problemas que
pudesse resolver. Mas esse princípio democrático básico deve
parecer perigoso a alguém, talvez porque alguns concelhos possam ser
administrados por pessoas suspeitas de não serem muito "racionais"
(lease neoliberais). Pensemos em um BNG em Pontevedra, em algumas
marés não faz muito tempo na Coruña ou Compostela, em um Cádiz,
em uma Barcelona ... para que seguir.
Aproveitando assim que havia uma crise, decidiu-se reduzir ao mínimo
a autonomia municipal, em um caminho que iniciou Zapatero (o chamado
segundo Zapatero, o do nefasto artigo 135 da constituição
reformada, essa tão irreformável até um pouco antes, e também a
partir de então, daquele momento extraordinário) e seguido por
várias leis do tandem Rajoy Montoro e culminada na Lei Orgânica
2/2012 de Estabilidade Orçamentaria e Sustentabilidade Financeira e
sua regra de gasto e a degradação dos “habilitados nacionais”
(secretários, interventores e tesoureiros) de altos funcionários do
concelho em vulgares "pára-quedistas" do ministério,
especialistas pouco mais do que em fazer "reparos de
legalidade".
Um caminho que levaria á administração mais próxima dos cidadãos,
a quem correspodería resolver o maior número de problemas possível,
a Simples Unidades Administrativas.
Este Decreto-Lei do Empréstimo não vaI no caminho de alcançar uma
administração municipal democrática e eficiente, eficaz e
efectiva, mas sim de mantê-la como uma paripé pseudo-democrático.
E já de traca, o cinismo do PP e da direita tentando conduzir a
oposição ao "empréstimo”.
https://www.sinpermiso.info/textos/municipios-y-hacienda-la-caja-de-los-truenos
(1) Ver, por exemplo, este artigo de 1992 de Manuel Fraga. No mesmo
disse: “O processo de racionalização também deve abrir um
processo de transferência cara á administração local, de
competências de titularidade autonómica, quando a sua prestação
por estas entidades dê lugar a um serviço público mais eficaz pela
sua proximidade a cidadão.”
A propósito, se o artigo fosse publicado por alguém hoje,
arriscaria-me a dizer que seria revisado detalhadamente por algum, ou
mais de um, juiz da Audiencia Nacional ou do Tribunal Supremo.
(podedes lelo enteiro para confirmar a minha sospeita)
https://elpais.com/diario/1992/04/13/espana/703116014_850215.html